Em fevereiro de 2011, o Julice Boulangère passou a ocupar um antigo sobrado localizado no bairro de Pinheiros, em São Paulo (SP). Com o crescimento do negócio, os proprietários adquiriram o terreno vizinho e chamaram o StudioARQBR Arquitetos Associados para projetar a ampliação do espaço. Inspirado pela presença de um container marítimo que servia como estoque de refrigerados e congelados do empreendimento, o escritório resgatou 13 dessas estruturas, cruzando-as umas sobre as outras para criar um grande vão central.
Entendemos que a boulangère, cuja origem é francesa, não deveria ser a caricatura de Provence, por exemplo. Queríamos levar o usuário de um ambiente bucólico para um mais contemporâneo Tadeu Melegatti“Entendemos que a boulangère, cuja origem é francesa, não deveria ser a caricatura de Provence, por exemplo. Queríamos levar o usuário de um ambiente bucólico para um mais contemporâneo”, introduz o arquiteto Tadeu Melegatti sobre o conceito de utilizar containers no projeto.
Ele e seu sócio, o também arquiteto Eduardo da Mata, pensavam que, se um modelo refrigerado resolvia momentaneamente a questão do estoque, outros modelos secos poderiam atender à expansão da padaria, abrigando novos sanitários, refeitório, escritórios, bem como parte da produção.
Mais que isso: a facilidade na montagem das estruturas em container agilizaria a obra e reduziria os custos, além de conceder à construção um caráter sustentável, já que reaproveitaria um material condenado ao descarte.
Os profissionais realizaram um estudo aprofundado para entender melhor a construção em container. “Juntamos uma equipe com projetistas complementares, de estrutura e de instalações, para desenvolver algumas técnicas de como o empilhamento poderia ser feito”, explica da Mata.
A partir daí, a equipe do StudioARQBR Arquitetos Associados cuidou das fundações. De acordo com da Mata, o estudo de solo mostrou que a área não tinha resistência suficiente para suportar a carga dos 13 containers. A solução foi executar duas estacas de concreto, de 45 toneladas cada uma, o que deixou o terreno pronto para a chegada das estruturas.
Segundo Melegatti, por questões estruturais, os pontos de apoio dos containers devem ocorrer somente nos cantos. No entanto, apenas empilhá-los não resultaria em um estilo diferenciado, tampouco possibilitaria a formação de corredores e vãos.
Para criar essas passagens, os arquitetos resolveram cruzar as “caixas”, que por sua vez, ganharam pequenos e múltiplos reforços estruturais de aço. O detalhe é que eles ficaram escondidos no isolamento térmico das vedações perimetrais, e assim, estabeleceram uma leitura visual limpa do prédio.
Após empilharem os containers, Melegatti e da Mata voltaram as atenções para a parte interna do imóvel. A proposta era permitir que os clientes da padaria enxergassem as chapas metálicas mesmo dentro do espaço, por isso, o teto foi mantido sem forro.
Em contrapartida, as paredes internas foram tratadas com lã de vidro e contenção em gesso acartonado. Segundo da Mata, esses materiais foram aplicados no interior dos containers para garantir o conforto térmico do Julice Boulangère Pinheiros.
“No estudo que fizemos, consideramos 400 V/m² de calor, o que significa uma temperatura interna de cerca de 65 °C”, menciona Melegatti. Sem recorrer ao ar-condicionado, a solução com gesso acartonado e lã mineral gerou eficiência térmica.
Para proteger as coberturas dos containers, o StudioARQBR trabalhou de maneira diferente, uma vez que a parte de cima da estrutura é mais fina em relação às laterais. Partindo da premissa de manter a textura original das “caixas de aço”, o isolamento ocorreu apenas naquelas que recebiam insolação direta.
Externamente, sobre o plano superior, foi elaborado um sistema em camadas que variava conforme o uso. Para a cobertura ajardinada, utilizou-se isopor de alta densidade e lastro em pedrisco, enquanto para as coberturas técnicas manteve-se o isopor, porém, com uma camada fina de concreto magro.
Simultaneamente à construção do edifício em container, a casa vizinha era reformada. Por solicitação dos proprietários do Julice Boulangère, a única ala poupada do quebra-quebra foi a loja de pães, que permaneceu aberta durante toda a obra.
“Demolimos todas as paredes internas para que o ambiente ficasse integrado e triplicamos a área de produção”, conta da Mata.
O estúdio também refez todo o piso do antigo sobrado, com a intenção de trazer a linguagem do asfalto para dentro do espaço. Sendo assim, aplicou-se o piso fulget – um material normalmente visto nas calçadas. “Por ser um revestimento mais rígido, permite qualquer tipo de uso, seja para montar uma mesa comunitária, seja para ficar em vários grupos individuais”, descreve o arquiteto.
O estudo cromático para os containers foi realizado com base na marca Julice Boulangère. Nas antigas embalagens dos produtos, os arquitetos encontraram três cores principais: branco, vermelho e amarelo. A primeira e a segunda compõem o logotipo; a última fazia referência ao saco de pão.
Na casa ao lado surgia o marrom, inspirado no antigo gradil do prédio. “Nós a incorporamos para não descaracterizar completamente aquilo que existia”, expõe da Mata. Para contrabalancear essa cor escura, foi definido o azul-turquesa nos containers. “Com tom mais esverdeado, ela funciona bem com as outras cores. Além disso, quando buscamos referências, vimos que ela está presente em outras padarias”, detalha da Mata.
Escritório
Termos mais buscados