Texto: Naíza Ximenes
Conhecidos por suas estruturas ovais ou circulares, os tulous são casas de terra características do povo Hakka, no sudeste da China, abrigando várias famílias e atuando como pequenas vilas fortificadas. As construções mais antigas datam do século XVII, mas, graças ao escritório Shieh Arquitetos, a comunidade Hakka do Brasil ganhou um exemplar em uma área nobre de São Paulo: o Hakka Residencial Terceira Idade.
Marcado por uma única porta de acesso e paredes externas grossas, feitas de argila e areia, esse tipo de construção faz parte da cultura arquitetônica do povo chinês, típico das áreas montanhosas de Fujian. Devido à arquitetura única e ao significado cultural, os tulous foram reconhecidos como Patrimônio Mundial pela UNESCO.
Movida pelo desejo de construir um complexo para a terceira idade que fosse referência em bem-estar e qualidade de vida, a comunidade Hakka brasileira escolheu um terreno de 5.700 metros quadrados na avenida Morumbi (um dos locais mais arborizados e de baixa densidade da cidade) para construir o Hakka Residencial Terceira Idade.
O projeto reproduz o mesmo conceito dos tulous tradicionais. É uma estrutura circular, fortificada, que tem um átrio central e abriga vários moradores. Como o terreno apresenta um declive significativo, com desnível de aproximadamente sete metros entre os pontos mais alto e baixo, ainda ganhou níveis superiores e inferiores além do térreo — resultado de uma implantação cuidadosa dos subsolos.
No total, são 9.400 metros quadrados de área construída, otimizados para o uso dos idosos e marcados por um design sofisticado. Logo na fachada, os brises verticais criam um cenário que reflete toda a grandiosidade do edifício, além de contribuírem para o controle térmico e de iluminação no interior.
Ao acessar o complexo pelo pavimento térreo, um grande saguão central, similar ao de um hotel de luxo, recebe os hóspedes e visitantes. As extremidades abrigam todos os espaços dedicados ao convívio social e atividades diversas, como restaurante, sala de TV, fisioterapia, piscina coberta, capela e sala de beleza. No centro do saguão, está o coração do Hakka Residencial Terceira Idade: um jardim utilizado como uma praça pelos hóspedes.
Uma pequena árvore é rodeada por floreiras e bancos de concreto que recebem luz solar direta — um ambiente pensado para quem deseja relaxar. Nas laterais, grandes escadas (que também têm formato levemente circular) levam ao primeiro pavimento, onde fica o solário e as primeiras áreas de acesso aos apartamentos.
A geometria cilíndrica da planta tem uma peculiaridade que, apesar de estar em plena avenida, é um espaço sem ruido sonoro. É bem confortável, bem gostoso de estar. Além disso, nós temos essa esplanada, quase como uma praça urbana, que, pela planta cilíndrica, permite ver e ser visto de todos os pavimentos Leonardo Shieh, arquiteto do Shieh Arquitetos
Os três pavimentos superiores abrigam 123 apartamentos, cada um projetado para acomodar de uma a três pessoas com conforto e segurança. A disposição das unidades considerou a construção de dois núcleos de enfermaria em cada pavimento, estrategicamente localizados para facilitar o atendimento aos residentes.
Nos subsolos, por sua vez, estão o estacionamento e as áreas técnicas, além de vestiários e depósitos. A circulação vertical acontece por quatro elevadores envidraçados, que também contribuem para a integração visual e o conforto dos moradores.
Em entrevista à Galeria da Arquitetura, o arquiteto Leonardo Shieh conta que a preocupação com a sustentabilidade e o conforto ambiental foi uma prioridade, já que, além dos brises verticais para sombreamento, eles também apostaram em painéis solares para aquecimento de água e reservatórios para reutilização de água pluvial. A ventilação cruzada e a iluminação natural foram igualmente priorizadas, com grandes envidraçamentos no átrio central.
O uso de materiais duradouros, como concreto armado na estrutura, granito no piso do térreo e divisórias de vidro, garante a longevidade e a estética do complexo. Nos pavimentos superiores, o piso vinílico e o mobiliário simples, mas ergonômico, refletem a preocupação com a acessibilidade e o bem-estar dos residentes.
O forro de gesso perfurado no saguão ajuda a controlar o ruído aéreo, proporcionando um ambiente tranquilo e confortável.
“É muito interessante imaginar que uma etnia tem como um símbolo cultural uma tipologia construtiva”, comenta Shieh. “Nós ficamos muito satisfeitos de termos feito uma releitura, uma homenagem a essa história do povo Hakka. Ter um residencial da terceira idade solicitado por eles, com essa marca, com essa identidade, com esse senso de cultura, é muito importante para nós”, conclui.
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