O número 145 da luxuosa rua Oscar Freire, em São Paulo, abriga um eco da arquitetura mediterrânea. A definição é do Coletivo de Arquitetos, escritório comandado pelos arquitetos Guile Amadeu e Rodrigo Lacerda, que concebeu o projeto arquitetônico do Restaurante Tanit.
A intenção dos profissionais era reforçar a marca gastronômica da casa e organizar os espaços através de uma solução exclusiva: o prisma de madeira. Ao revestir as paredes e o forro do salão principal, esse elemento brinca com as variações do pé-direito, define o layout desde a área externa e ainda proporciona a entrada de iluminação natural.
Duas outras premissas nortearam a concepção do projeto. A primeira buscou atender às questões técnicas e funcionais relacionadas especialmente à cozinha do Restaurante Tanit, cujo layout deveria corresponder às necessidades do chef Oscar Bosch. Já a segunda procurou dar um novo visual ao espaço, uma vez que no antigo estabelecimento já operava um restaurante.
Por essas razões, o imóvel sofreu uma demolição quase completa. Como contam Amadeu e Lacerda, alguns elementos construtivos foram mantidos em função de toda a amarração do projeto, como a laje, que recebeu apenas um reforço estrutural. “No mais, mexemos em tudo, inclusive na infraestrutura”, acrescentam.
A intervenção também teve a participação do chef Bosch, que solicitou aos arquitetos – ainda na fase de projeto –, uma abertura da área onde estava prevista a cozinha. Assim, ficaria mais claro imaginar seu futuro espaço de trabalho. “Na verdade, fizemos o processo inverso. Ao invés de iniciar a obra e executá-la até o final, realizamos essa demolição parcial que amarrou uma série de elementos técnicos – inclusive de layout –, para o funcionamento do ambiente de acordo com o tipo de cozinha proposta pelo chef”, explica Guile.
O que chama mais atenção no Restaurante Tanit é o forro, que reveste completamente as paredes e o teto do salão principal. De acordo com Guile, a ideia era conceber algo fora do convencional – cor branca e formato plano –, para aproveitar o amplo pé-direito do imóvel.
Curiosamente, a entrada da casa tem pé-direito baixo, mas ao longo do percurso toma outras proporções até chegar a um pé-direito duplo, que confere uma espacialidade diferenciada e entradas de luz inusitadas.
Essas ‘janelas zenitais’ banham a área onde ficam os clientes e desenham sombras, que alteram a iluminação do restaurante ao longo do dia Rodrigo LacerdaO projeto se divide em três núcleos: varanda, salão e área técnica, que estão respectivamente localizados na parte externa, térreo e laje. Nesta última, cria-se um mezanino que acomoda os banheiros para os clientes, o vestiário dos funcionários, o depósito e o estoque.
A cozinha, de 26 m², segue posicionada no fundo do imóvel e exposta ao salão principal através de planos de vidros transparentes, para que possa ter ligação direta com o restante do projeto. Acima dela, a adega cumpre o papel de definir o limite entre a área técnica e o salão principal, sem criar uma barreira visual muito forte em relação aos demais ambientes.
Para o mobiliário, o objetivo era propor algo que não se limitasse a um único estilo, pois o restaurante recebe diversos tipos de clientes, de casais a grupos de amigos. Então, optou-se por móveis como o sofá com formato em “L” e as mesas centrais, sendo que a ambientação foi trabalhada em parceria com a arquiteta Maria Magalhães.
As referências mediterrâneas interferiram na escolha dos materiais. Assim, o aspecto rústico tomou conta do Restaurante Tanit, com a utilização de madeira nas paredes e pergolados, pedras embaixo dos bancos da área externa e concreto liso resinado no piso. Já na face externa, aplicou-se um reboco grosso pintado de branco, em uma referência clara às fachadas mediterrâneas. Segundo Lacerda, a intenção era apropriar-se dos materiais na sua essência.
Pensando na questão sustentável, a madeira que recobre o salão principal é o eucalipto citriodora, uma árvore reflorestada e aparelhada em carpintaria no interior de São Paulo.
O terreno estreito e comprido, com cerca de 5 metros de frente por 23 metros de profundidade, impôs algumas dificuldades. Sem recuo, tanto as estruturas do telhado quanto as do mezanino se apoiam nas paredes vizinhas, o que impossibilitou a criação de aberturas laterais.
Assim, a saída para levar iluminação natural ao Restaurante Tanit foi aproveitar a incidência de luz que vem da fachada frontal. Dessa maneira, a primeira metade do espaço interno recebe uma série de rasgos, formados não somente pelo desenho do prisma de madeira, como pelos brises e panos de vidro. “Essas ‘janelas zenitais’ banham a área onde ficam os clientes e desenham sombras, que alteram a iluminação do restaurante ao longo do dia”, afirma Lacerda.
A lã de rocha é responsável pela absorção do ruído gerado em função do volume de pessoas num espaço relativamente pequeno Guile e LacerdaA quantidade de iluminação natural que entra no estabelecimento é suficiente para deixá-lo abastecido de luz durante o dia. Sendo assim, apenas à noite a iluminação artificial é necessária. “O projeto luminotécnico foi realizado pela arquiteta Ana Espina, que adotou a sistema dimerizado para criar um ambiente acolhedor e, consequentemente, um lugar de permanência”, menciona Guile, citando como exemplo dessa técnica a luz quente que fica acesa embaixo dos bancos do salão.
Quanto à ventilação, o arquiteto comenta que a falta de aberturas laterais impossibilitava que ela fosse cruzada. Por isso, o controle térmico se faz através de aparelhos de ar-condicionado e aquecedores.
A mistura de materiais distintos, como madeira, estofados e pedras, ajuda no conforto acústico do Restaurante Tanit. No entanto, a maior contribuição vem do uso de lã de rocha no espaço compreendido entre a parede e a pele de madeira que, ao apresentar pequenas frestas entre as réguas, permite que a lã trabalhe acusticamente. “Esse material isolante é responsável pela absorção do ruído gerado em função do volume de pessoas num espaço relativamente pequeno”, pontuam Guile e Lacerda.
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