Fincada em uma paisagem deslumbrante, na Serra da Mantiqueira, em São Paulo, a Casa Grelha, dependendo do ângulo de visão, ora parece ser domada pelo íngreme terreno, ora parece integrar-se a ele e dominá-lo. Isso acontece porque há uma relação direta entre terreno, construção e natureza estabelecida de forma surpreendente no projeto dos arquitetos Fernando Forte, Lourenço Gimenes e Rodrigo Marcondes Ferraz do escritório FGMF – Forte, Gimenes & Marcondes Ferraz Arquitetos.
Imagine um terreno de 22 alqueires coberto pela exuberante mata virgem, de proteção É um pequeno vale protegido dos ventos e próximo à mata. Um lugar de encontro dos trajetos naturais do pedestre, dando acesso a uma trilha que adentra a mata e leva a uma impressionante vista no topo do morro Fernando Forte permanente. Nele, apenas uma área de 65 mil m² é livre de vegetação, mas apresenta topografia bastante acidentada, onde afloram grandes pedras cercadas por araucárias. “É um pequeno vale protegido dos ventos e próximo à mata. Um lugar de encontro dos trajetos naturais do pedestre, dando acesso a uma trilha que adentra a mata e leva a uma impressionante vista no topo do morro”, descreve Fernando Forte.
Para integrar-se ao território sem obstruí-lo, a casa está suspensa sobre uma grelha estrutural de madeira, com módulos de 5,5 x 5,5 x 3 m, ocupados por ambientes fechados ou totalmente abertos, para que as árvores do jardim inferior atravessem a estrutura. Abaixo, o núcleo de acessos preservado conecta os caminhos existentes e cria novos. Assim, é possível atravessar a estrutura como se ela fosse uma ponte, por cima (pelo teto-jardim que é uma continuidade do terreno); por baixo (através de um jardim com espelho d’água e pedras naturais) e pelo meio da casa (através de uma circulação externa coberta).
A demanda por uma casa térrea, a vontade de estar mais próximo da natureza, com plena adaptação ao terreno, e a necessidade de ter privacidade para a família nortearam a concepção do projeto. Além desses fatores, os autores consideram a grande umidade da região, que sugeria uma construção elevada do solo, sob pilotis. No programa, composto por um núcleo – interior da grelha – e três módulos isolados, há um interessante e funcional jogo de cheios e vazios, que organiza o partido de forma fragmentada e resguarda a privacidade dos usuários. Dentro da grelha concentram-se áreas de serviço, sociais, quarto de hóspedes e apartamento do proprietário. Cada um dos módulos, planejados para os filhos, oferece dois quartos. Entre os espaços fechados, módulos vazios complementam a estrutura, e desses vãos brota o jardim.
“A casa se transforma em terreno e o terreno em casa, construindo uma nova paisagem”, explica o arquiteto Fernando. Como se fossem mirantes, a partir dos vazios internos e externos é possível contemplar várias paisagens: as pedras e o jardim sob a grelha, a mata virgem nos arredores, as árvores do entorno e os arrimos de pedra, onde a casa mergulha.
Apoiada em um conjunto de pilares de concreto, a grelha de madeira está encravada no morro em duas laterais, como se surgisse do solo. O contato entre a construção e o terreno é feito por muros executados com pedras retiradas do próprio local. Grandes vigas-vagão de aço corten, com 11 m de comprimento cada, aparecem em um intervalo a cada dois módulos. A forma como foram calculadas na estrutura de 2.000 m² evita o número excessivo de pilares – reduzidos a pouco mais da metade – e garante uma vista mais aberta para o jardim inferior.
Com um pino central, formato triangular e três cabos tencionados, o funcionamento da viga é semelhante ao de uma tesoura de telhado invertida. O pino recebe a carga do pilar imediatamente acima, enquanto os cabos a transferem para as pontas desta viga, de onde a carga é passada para os pilares próximos ao solo. A dificuldade de acesso à obra exigiu o transporte das vigas-vagão em duas vezes, com montagem feita no próprio canteiro.
Outros materiais estruturais fazem parte da construção, como o concreto e a pedra, mas a madeira presente na grelha e o aço são os verdadeiros protagonistas. Nas vigas-vagão, o aço atua como elemento de ligação entre diversos materiais. Exemplo disso é o apoio da grelha estrutural nos pilares de concreto, que é feito por meio de capitéis – peças metálicas capazes de unir peças de concreto, de madeira e do próprio aço. Sobre o morro mais alto, destacado e ao mesmo tempo integrado à paisagem, o pavilhão de lazer divide-se em dois blocos com a mesma modulação da residência principal. Ele se apoia em vigas metálicas de aço corten na forma de asa delta distantes 5,5 m, o que permite um balanço de 100% da estrutura e dá a impressão de que a estrutura flutua na borda do morro, de onde se tem a vista mais generosa do terreno montanhoso. Usado tanto na estrutura quanto em peças metálicas, o aço é o elemento principal da composição, somando 68 toneladas do material aplicado na residência.
O pavilhão de lazer é formado por dois blocos e, entre eles, um pátio oferece atividades externas. A mesma grelha estrutural serve perfeitamente ao pavilhão e à residência, embora ambos evidenciem situações antagônicas da ocupação do terreno – no morro e no vale.
Garagens, casa de caseiro, quartos de empregada, vestiários, depósitos, entre outros, ocupam três pavilhões de serviço e foram construídos com o mesmo módulo de 5,5 x 5,5 m, embora apresentem estrutura de pedra. A função das grandes empenas paralelas de pedra, fincadas no solo, é de suspender as lajes.
Com conceito orgânico, difundido pelo arquiteto Frank Lloyd Wright, a Casa Grelha foi guiada pela A casa se transforma em terreno e o terreno em casa, construindo uma nova paisagem Fernando Forte sustentabilidade desde a escolha do local de implantação até as soluções construtivas e arquitetônicas, que preservam ao máximo a drenagem do terreno e movimentação de terra. Os muros de arrimo são de pedras retiradas das próprias escavações das fundações. Além disso, há uma central de tratamento de esgoto e 70 mil mudas de diversas espécies nativas foram plantadas para compor o paisagismo. Elaborado por Sidney Linhares e Fernando Chacel, o paisagismo integra-se à natureza, respeitando a mata nativa em três escalas de intervenção. A primeira faz a transição entre o campo aberto e a floresta fechada, reconstituindo as margens da mata por meio da utilização de espécies vegetais nativas e compatíveis à flora. A segunda intervém no restante da área descampada, com a criação de um parque com percursos e descansos nos principais pontos de interesse visual.
Por último, nos locais próximos às construções, houve o planejamento de um jardim de pré-arquitetura. Na cobertura contínua ao terreno, um espelho d’água linear evita o uso de guarda-corpo e se relaciona com o grande espelho d’água localizado no jardim inferior, ao redor da maior pedra existente no local. Tudo minuciosamente pensado com o objetivo de preservar e respeitar o meio ambiente onde a construção está inserida.
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